O que é assédio judicial?

O assédio judicial tem se tornado um tema de grande relevância no cenário jurídico brasileiro, especialmente no que se refere à proteção da liberdade de expressão e ao exercício do jornalismo.

NOVIDADES LEGISLATIVAS E JURISPRUDENCIAIS

6/18/20243 min read

O assédio judicial tem se tornado um tema de grande relevância no cenário jurídico brasileiro, especialmente no que se refere à proteção da liberdade de expressão e ao exercício do jornalismo. Este artigo busca esclarecer o conceito de assédio judicial, ilustrando-o com um caso emblemático envolvendo jornalistas e o recente julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema.

Conceito de Assédio Judicial

O assédio judicial ocorre quando múltiplas ações judiciais são propostas contra um mesmo réu, geralmente em diferentes jurisdições, com o objetivo de intimidar, perseguir ou dificultar a defesa. Trata-se de uma prática abusiva do direito de ação, que visa não apenas a busca de reparação legítima, mas também a sobrecarregar e enfraquecer o alvo das ações, muitas vezes em retaliação por suas atividades profissionais ou opiniões expressas.

Características do Assédio Judicial
  1. Multiplicidade de Ações: O ajuizamento de diversas ações judiciais com base nos mesmos fatos ou contra a mesma pessoa.

  2. Dispersão Geográfica: As ações são distribuídas em diferentes comarcas ou Estados, dificultando a defesa coordenada.

  3. Intimidação e Perseguição: O objetivo principal é intimidar ou perseguir o réu, frequentemente um jornalista ou veículo de comunicação.

  4. Obstáculos à Defesa: A fragmentação das ações torna a defesa mais onerosa e complexa, podendo inviabilizar uma resposta eficaz.

Caso dos jornalistas

Em 2021, a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) ajuizaram ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs 6.792/DF e 7.055/DF) perante o STF, visando combater o assédio judicial contra jornalistas e empresas de comunicação. As entidades argumentaram que havia uma proliferação de decisões judiciais condenando jornalistas por críticas a figuras públicas ou em assuntos de interesse público, criando um "efeito silenciador da crítica pública" e afrontando a liberdade de expressão e de informação jornalística.

A ABI destacou que tais condenações não apenas interrompiam ou prejudicavam o funcionamento de órgãos de imprensa, mas também ameaçavam a subsistência dos profissionais de comunicação. A entidade sustentou que jornalistas e veículos de imprensa, ao publicarem matérias de boa-fé sobre casos de corrupção ou atos de improbidade, que não foram definitivamente comprovados, não deveriam sofrer retaliações judiciais.

O STF, ao julgar as ADIs 6.792/DF e 7.055/DF, fixou importantes diretrizes para a proteção dos jornalistas e a definição de assédio judicial. A Corte estabeleceu que:

  1. Assédio Judicial e Liberdade de Expressão: Constitui assédio judicial o ajuizamento de inúmeras ações a respeito dos mesmos fatos, em comarcas diversas, com o intuito ou efeito de constranger jornalistas ou órgãos de imprensa, dificultar sua defesa ou torná-la excessivamente onerosa.

  2. Centralização das Ações: Caracterizado o assédio judicial, a parte demandada poderá requerer a reunião de todas as ações no foro de seu domicílio, conforme o artigo 46, caput, do Código de Processo Civil (CPC).

  3. Responsabilidade Civil dos Jornalistas: A responsabilidade civil de jornalistas ou de órgãos de imprensa somente estará configurada em caso inequívoco de dolo ou culpa grave (evidente negligência profissional na apuração dos fatos).

A decisão do STF reforçou a proteção à liberdade de expressão, destacando que jornalistas e meios de comunicação não devem ser penalizados por informar sobre questões de interesse público, a menos que haja clara intenção de prejudicar ou negligência grave.

Outras hipóteses de Assédio Judicial

Além dos casos envolvendo jornalistas, o assédio judicial pode ser caracterizado em outras situações. Denúncias falsas movidas pelo Ministério Público ou ações cíveis fraudulentas também podem configurar assédio judicial, especialmente quando utilizadas como ferramentas para intimidar ou prejudicar o réu. Essas práticas, quando abusivas, visam desgastar o acusado com processos infundados, sobrecarregando o sistema judiciário e dificultando a defesa.

Nesse contexto, é relevante mencionar o fenômeno conhecido como lawfare, que consiste no uso estratégico de ações judiciais para fins políticos, de perseguição ou de deslegitimação de adversários.

Assim, tanto denúncias infundadas quanto ações fraudulentas se enquadram no conceito de assédio judicial, pois utilizam o aparato judicial de maneira maliciosa para alcançar objetivos ilegítimos.

Conclusão

O assédio judicial representa uma ameaça significativa à liberdade de expressão e ao exercício do jornalismo. A prática de ajuizamento múltiplo e disperso de ações judiciais visa intimidar e dificultar a defesa dos jornalistas, comprometendo seu trabalho e, por extensão, o direito da sociedade à informação. A decisão do STF nas ADIs 6.792/DF e 7.055/DF é um marco importante na defesa desses direitos, ao estabelecer critérios claros para identificar e combater o assédio judicial, e ao assegurar que a responsabilidade civil dos jornalistas seja aplicável apenas em casos de dolo ou culpa grave.